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Incorporação de Empresa com Extinção da Incorporada – Possibilidade de Aproveitamento do Prejuízo Além de 30% na Incorporada, em Havendo Lucro

18/02/2010
Por Ives Gandra da Silva Martins


 

Consulta

Formula-me, o eminente advogado José Mauro Marques, a seguinte consulta:

"Submeto ao eminente jurista a questão abaixo enunciada, sobre a qual pretendo obter parecer, para sustentar razões de novo exame ao Conselho Administrativo de Recursos Fiscais – CARF em Brasília.

I – Fatos

1. A empresa veio a ser incorporada à sociedade, conforme deliberado por assembleia geral de sócios ocorrida em 30.04.04, e publicada em DOU em 22.11.04, que também consolidou os seus Estatutos;

2. Portanto, a sociedade tornou-se a sucessora da empresa, por força do art. 227 da Lei nº 6.404/76;

3. A empresa (empresa/incorporada), tinha como seu objetivo social a exploração agrícola. Mantinha em seu ativo uma fazenda – composta de terra nua, plantação de laranja, benfeitorias e criação/engorda de gado. Estava submetida ao regime fiscal tributado pelo lucro real;

4. Durante vários anos consecutivos registrou prejuízos apurados regularmente em seus balanços e escriturados no LALUR;

5. Por não conseguir reverter sua situação operacional, decidiu vender a fazenda, cuja terra nua estava com valor contabilizado histórico, ou seja, muito abaixo do valor de mercado;

6. Vendida a fazenda, perdeu sua base operacional;

7. Os acionistas resolveram encerrar as atividades da empresa e propuseram e justificaram a sua incorporação pela sociedade (incorporadora);

8. Na oportunidade, foi elaborado o laudo de avaliação que apurou o patrimônio líquido a ser incorporado;

9. Efetuou o balanço de encerramento e o apresentou à Receita Federal, nos termos da legislação;

10. A Receita glosou a compensação dos prejuízos acumulados pela incorporada, com fundamento nos arts. 247, 250, inciso III, 251, caput e parágrafo único, e 510 do Decreto nº 3.000 (regulamento do imposto de renda), lavrando um auto de infração, acrescendo o principal de multa e juros;

11. Por decorrência, com base no art. 2º, caput e parágrafos, da Lei nº 7.689/88, art. 58 da Lei nº 8.981/95, art. 16 da Lei nº 9.065/95 e art. 37 da Lei nº 10.637/02, lavrou também auto de infração para recolhimento da CSLL, acrescido de multa e juros;

12. Os autos de infração foram lavrados em nome da incorporada. Porém, a cobrança está sendo efetuada, da incorporadora como sua sucessora;

13. Foi apresentada pela autuada defesa contra o auto de infração (cópia anexa);

14. O processo tomou o número 1915.004563/2008-61 e foi julgado pela 3ª Turma da DRJ/SPOI que proferiu o Acórdão de nº 16-21.219 (cópia inclusa);

15. Razões da defesa

A incorporada (autuada) fundou-se, em resumo, nas seguintes razões, para amortizar o seu prejuízo fiscal, por ocasião do balanço de encerramento:

i) A limitação percentual (30%) para amortização de prejuízos de exercícios anteriores, pressupõe a continuidade operacional com a consequente obtenção de lucros;

ii) O CTN define o conceito de renda (art. 43-I);

iii) A lei não veda expressamente a amortização integral dos prejuízos acumulados, quando do encerramento de atividade;

iv) A lei fixa a responsabilidade do sucessor no caso de créditos tributários já constituídos no ato da sucessão (art. 132 do CTN);

v) O princípio da equidade e isonomia, uma vez que, se prevalecer a tese fiscal, o contribuinte sofrerá um confisco na sua renda, limitado pelo prejuízo não compensável no caso de extinção de atividades;

vi) As decisões do Conselho de Contribuintes na época decidiam pela permissividade da amortização integral no caso de incorporação;

vii) A doutrina e a jurisprudência constituem no direito pátrio elementos básicos para as decisões;

viii) A modificação de orientação acarreta a insegurança jurídica;

16. Os pontos básicos da defesa se acham no Recurso, cuja cópia também está em poder do eminente Mestre.

17. Ao alinhar os pontos do Recurso, pretendendo a reforma da decisão de primeira instância, ocorreu-me socorrer-me de parecer, permitindo-me colocar em relevo os quesitos seguintes:

a) A empresa autuada, sociedade, não efetuou compensação alguma de prejuízo nos exercícios mencionados pela Receita, prejuízos estes experimentados pela empresa incorporada.

b) A empresa incorporada, empresa, compensou prejuízos fiscais no exercício fiscal de 2003/2004, e não observou o limite de 30% (trinta por cento).

Indaga-se:

i) Em virtude de tal limitação, e considerando o disposto no art. 227 da Lei nº 6.404/76, isto é, a extinção da empresa por sua absorção na incorporadora, a legislação brasileira veta o procedimento observado pela empresa incorporada?

ii) A imposição fiscal teve como base transgressão do art. 15 da Lei nº 9.065/95.

Indaga-se:

Como teria ocorrido a violação de tal dispositivo, se a empresa incorporadora não compensou os indigitados prejuízos? Nesse passo, a empresa incorporadora não carrega para si direitos e obrigações, conforme o art. 227 da Lei nº 6.404/76?

iii) Extinguindo-se a empresa pela incorporação, suas demonstrações financeiras de encerramento antes da operação, terão de abrigar a ‘trava’ de 30 % (trinta por cento), prevista nos arts. 42 da Lei nº 8.981/95, e 15 da Lei nº 9.065/95?

iv) Na hipótese positiva, como entende o Fisco, o saldo não compensado do prejuízo fiscal apurado fica inaproveitável, e isso configura perda de patrimônio.

Indaga-se:

O princípio constitucional da vedação ao confisco (art. 150, IV, CF) pode ser invocado em abono do aproveitamento total do aludido prejuízo?

Também pode no mesmo sentido, invocar-se agressão ao direito de propriedade (art. 5º, XXII, CF)?

v) No contexto em discussão, não se pode deixar de invocar o conceito de renda ou proventos.

Indaga-se:

Face ao entendimento do Fisco, milita em favor da empresa autuada o disposto no art. 44 do CTN (conceito de renda)?

vi) Como compatibilizar o disposto no art. 44, do CTN, com a restrição contida no art. 15, da Lei nº 9.065/95?

vii) O ordenamento jurídico pátrio não contempla a situação aqui tratada (compensação integral do prejuízo fiscal por empresa incorporada antes da operação de incorporação, segundo pude constatar, salvo engano).

Indaga-se:

Nessa hipótese, poderia o Fisco utilizar o princípio da legalidade para justificar a autuação?

Como se orienta a jurisprudência administrativa e judicial sobre a matéria?

Acredito que o eminente jurista, bem avaliando as premissas acima elencadas, concluirá pelo correto proceder da autuada, frente às circunstâncias especiais, que ensejaram o aproveitamento do prejuízo fiscal, em operação que se baseou em jurisprudência majoritária do antigo Conselho de Contribuintes."

Resposta

Algumas breves considerações fazem-se necessárias antes de responder às questões formuladas pelo eminente advogado consulente.

Mister se faz mostrar que as perguntas mencionadas centram-se, de rigor, em uma única questão: a de se saber se na extinção de uma empresa – assim determina a lei comercial, art. 227, § 3º, da Lei das S/As, nos casos das empresas incorporadas 1 –, em havendo lucro, pode ela compensar a totalidade de seus prejuízos e não apenas os 30% a que faz menção a Lei nº 9.065/95, no art. 15 2 para empresas em funcionamento 3.4;5;6;7;8.910.11.1213.14.15.16;17 (grifos meus).18.19.2021.22.23.24.25.26.27.28.29.30.31.32;33;34. Se correta fosse a interpretação fiscal, o artigo seria inconstitucional pois violaria os três princípios: "não confisco", "capacidade contributiva" e "igualdade" 35.36.37.38.

NOTAS
1 - Reza o art. 227, § 3º, da Lei nº 6.404/76: "Art. 227. A incorporação é a operação pela qual uma ou mais sociedades são absorvidas por outra, que lhes sucede em todos direitos e obrigações. (...) § 3º Aprovado pela assembleia geral da incorporadora, extingue-se a incorporada, competindo à primeira promover o arquivamento e a publicação dos atos de incorporação." (grifos meus)
2 - O artigo mencionado está assim redigido: "Art. 15. O prejuízo fiscal apurado a partir do encerramento do ano-calendário de 1995, poderá ser compensado, cumulativamente com os prejuízos fiscais apurados até 31 de dezembro de 1994, com o lucro líquido ajustado pelas adições e exclusões previstas na legislação do imposto de renda, observado o limite máximo, para a compensação, de trinta por cento do referido lucro líquido ajustado. Parágrafo único. O disposto neste artigo somente se aplica às pessoas jurídicas que mantiverem os livros e documentos, exigidos pela legislação fiscal, comprobatórios do montante do prejuízo fiscal utilizado para a compensação."
3 - Fernando Albino, Plínio Garcia, Ricardo Barreto Ferreira da Silva e Fernando Salvia aconselham na extinção da incorporada a cautela com seus acionistas: "A partir da data da publicação da ata desta assembleia da incorporada, passará a fluir o prazo de 30 (trinta) dias para o exercício do direito de retirada dos acionistas dissidentes conforme previsto no art. 230. Em função disso, na prática, é conveniente que, antes de se dar sequência aos trâmites posteriores da operação de incorporação, aguarde-se o decurso desse prazo. Outra alternativa seria a de, antes mesmo de se iniciar o procedimento da incorporação, acautelarem-se os interessados em obter, de todos os acionistas, um acordo, visando a garantir o exercício do direito de voto nessa assembleia, em favor da incorporação, ou ainda, comprarem as ações ou quotas daqueles que sabidamente não concordarão com a operação. Como último passo dessa fase deliberativa, reúnem-se novamente, em assembleia geral, os sócios ou acionistas da incorporadora para aprovar o laudo de avaliação e concretizarem a incorporação, extinguindo-se, consequentemente, a incorporada." (Comentários à Lei das Sociedades por Ações. Coordenação de Geraldo de Camargo Vidigal e Ives Gandra Martins. 1. ed. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 1990. p. 735 – grifos meus)
4 - "ACÓRDÃO Nº CSRF/01-05.100. Órgão: Câmara Superior de Recursos Fiscais – CSRF. IRPJ. COMPENSAÇÃO DE PREJUÍZO. LIMITE DE 30%. EMPRESA INCORPORADA. À empresa extinta por incorporação não se aplica o limite de 30% do lucro líquido na compensação do prejuízo fiscal. Recurso provido. Número do Recurso: 101-122596; 1ª T.; Número do Processo: 10980.011045/99-90; Tipo do Recurso: Recurso de Divergência; Matéria: IRPJ; Recorrente: Electrolux do Brasil S/A (Suc. da Embel – Empresa Bras. Esp. no Com. de Eletrodomésticos Ltda. e da Prosdócimo – Assist. Técnica de Eletrodomésticos Ltda.); Interessada: Fazenda Nacional; Data da Sessão: 19.10.04, 09:30:00. Relator: José Henrique Longo – Acórdão nº CSRF/01 -05.100. Decisão: DPU – Dar provimento por unanimidade. Texto da decisão: Por unanimidade de votos, dar provimento ao recurso. Fez sustentação oral o advogado da recorrente Dr. Dicler de Assunção – OAB/PR 7.498. Presente ao julgamento o Sr. Procurador da Fazenda Nacional, Dr. Sérgio de Moura. Data de decisão: 19.10.04, Processo nº 10980.011045/99-90. Recurso nº RD 101-122596; Matéria: IRPJ (Exercício 1997); Recorrente: Electrolux do Brasil S/A; Recorrida: 1ª Câmara do 1º Conselho de Contribuintes; Interessada: Fazenda Nacional; Sessão de 19 de outubro de 2004; Acórdão nº CSRF/01-05.100 IRPJ. COMPENSAÇÃO DE PREJUÍZO. LIMITE DE 30%. EMPRESA INCORPORADA. À empresa extinta por incorporação não se aplica o limite de 30% do lucro líquido na compensação do prejuízo fiscal. Recurso provido. Vistos, relatados e discutidos os presentes autos de recurso interposto por Electrolux do Brasil S/A. Acordam os membros da Primeira Turma da Câmara Superior de Recursos Fiscais, por unanimidade de votos, dar provimento ao recurso, nos termos do relatório e voto que passam a integrar o presente julgado. Manoel Antônio Gadelha Dias – Presidente. José Henrique Longo – Relator. Participaram, ainda, do presente julgamento, os Conselheiros: Antonio de Freitas Dutra; Maria Goretti de Bulhões Carvalho; Cândido Rodrigues Neuber; Victor Luís de Salles Freire; Leila Maria Scherrer Leitão; Remis Almeida Estol; José Clóvis Alves; José Carlos Passuello; José Ribamar Barros Penha; Wilfrido Augusto Marques; Marcos Vinícius Neder de Lima; Carlos Alberto Gonçalves Nunes; Dorival Padovan e Mário Junqueira Franco Júnior." (site Internet <http://www.decisoes.com.br> – grifos meus)
5 - STJ – Recurso Especial nº 183.155: "TRIBUTÁRIO. DEDUÇÃO DE PREJUÍZOS FISCAIS. LIMITAÇÃO. LEI Nº 8.981/95. LEGALIDADE. 1. A limitação estabelecida na Lei nº 8.981/1995, para a dedução de prejuízos das empresas, não alterou o conceito de lucro ou de renda, porque não se imiscuiu nos resultados da atividade empresarial. 2. O art. 52 da Lei nº 8.981/1995 diferiu a dedução para exercícios futuros, de forma escalonada, começando pelo percentual de 30% (trinta por cento), sem afronta aos arts. 43 e 110 do CTN." In: BEZERRA, Maurício Dantas. Da inaplicabilidade da limitação à compensação de prejuízos fiscais nos casos de incorporação, fusão e cisão de sociedades. Revista Dialética de Direito Tributário, n. 96, p. 54 – grifos meus
6 - "Art. 33. A pessoa jurídica sucessora por incorporação, fusão ou cisão não poderá compensar prejuízos fiscais da sucedida." (grifos meus)
7 - "No Diário Oficial do Congresso Nacional de 14 junho de 1995, a fls. 3.270, consta a exposição de motivos da Medida Provisória nº 998/95, reedição das Medidas Provisórias ns. 947/95 e 972/95 e convertida na Lei nº 9.065/95. Dela se pode destacar o seguinte excerto: Arts. 15 e 16 do Projeto: decorrem de Emenda do Relator, para restabelecer o direito à compensação de prejuízos, embora com as limitações impostas pela Medida Provisória nº 812/94 (Lei nº 8.981/95). Ocorre hoje vacatio legis em relação à matéria. A limitação de 30% garante uma parcela expressiva da arrecadação, sem retirar do contribuinte o direito de compensar, até integralmente, num mesmo ano, se essa compensação não ultrapassar o valor do resultado positivo." (1º CC, 8ª Câmara, Acórdão nº 108-06.682, Conselheiro Relator Mário Junqueira Franco Jr., j. 20.09.01, DOU 28.02.02 – grifos meus)
8 - Pedro Anan Jr. e Juliana Grandino Latorre escrevem: "Face a essas considerações, entendemos que não há qualquer impedimento na utilização do prejuízo fiscal e da base negativa da CSLL sem a trava de 30%, em caso de extinção da sociedade incorporada; tampouco quanto à incorporação da empresa controladora pela controlada; bem como na incorporação de empresa lucrativa por deficitária, quando pertencentes ao mesmo Grupo Econômico. As operações por ora referidas foram analisadas pelo Conselho de Contribuintes e possuem bons precedentes jurisprudenciais acerca da respectiva viabilidade. Na hipótese de obtenção de decisão administrativa favorável e eventual questionamento por parte do Ministério Público Federal ou da Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional, visando a submissão da decisão administrativa pelo Judiciário, o contribuinte estará amparado por decisões judiciais, tanto do STF quanto do STJ, rechaçada tal possibilidade de interferência, e ratificando a perenidade da decisão administrativa." (Incorporação: aspectos relevantes e a posição do Conselho de Contribuintes. Imposto de renda pessoa jurídica: teoria e prática. Coordenação de Pedro Anan Jr. São Paulo: Quartier Latin, 2007. p. 305/6)
9 - Escrevi: "Nos debates com constituintes e nos contactos não só com os membros da Comissão, mas também com o denominado grupo ‘Centrão’, que pediu a Hamilton Dias de Souza e a mim a preparação de um anteprojeto articulado, concordaram conosco e colocaram, por decorrência, no Texto, o princípio de que nenhum tributo, qualquer que fosse a sua espécie, poderia ingressar no cenário jurídico sem que houvesse, antes, sua definição em lei complementar. A letra ‘a’, portanto, diz que a lei complementar cuidará: da definição dos tributos e suas espécies, mas em relação aos impostos, além da definição, faz menção à necessidade de previsão dos respectivos fatos geradores, bases de cálculo e contribuintes. À evidência, dever-se-ia falar em ‘tributo’ e não ‘tributos’, posto que o tributo é gênero do qual pendem as cinco espécies tributárias hospedadas pelo sistema. Por entender que tal definição é estruturalmente uma norma geral, considero que também a definição dos respectivos fatos geradores, bases de cálculo e contribuintes das demais espécies tributárias, deve ser veiculada por lei complementar. O advérbio ‘especialmente’ não exclui, antes inclui, por sua natureza e não por sua indicação, tais aspectos como reguláveis apenas por lei complementar também em relação às demais espécies." (O sistema tributário na Constituição. 6. ed. São Paulo: Saraiva, 2007. p. 140/1)
10 - O Ministro Moreira Alves esclarece o que seja a explicitação por lei de conceitos implícitos da lei suprema: "E, a meu ver, está absolutamente correto. Porque não é possível se admitir que uma lei complementar, ainda que a Constituição diga que ela pode regular limitações à competência tributária, possa aumentar restrições a essa competência. Ela pode é regulamentar. Se é que há o que regulamentar, em matéria de imunidade, no sentido de ampliá-la ou reduzi-la. Porque isso decorre estritamente da Constituição. Quando se diz, por exemplo, ‘para atender às suas finalidades essenciais’, não é a lei que vai dizer quais são as finalidades essenciais. Quem vai dizer quais são as finalidades essenciais é a interpretação da própria Constituição. Porque Constituição não se interpreta por lei infraconstitucional, mas a lei infraconstitucional é que se interpreta pela Constituição." (Processo Administrativo Tributário. Pesquisas Tributárias – nova série, n. 5. Coordenação de Ives Gandra Martins. 2. ed. São Paulo: CEU/RT, 2002. p. 31/2 – grifos meus)
11 - Escrevi: "Em direito tributário, como, de resto, na grande maioria das hipóteses em que a lei complementar é exigida pela Constituição, tal veículo legislativo é explicitador da Carta Magna. Não inova, porque senão seria inconstitucional, mas complementa, esclarecendo, tornando clara a intenção do constituinte, assim como o produto de seu trabalho, que é o princípio plasmado no Texto Supremo. É, portanto, a lei complementar norma de integração entre os princípios gerais da Constituição e os comandos de aplicação da legislação ordinária, razão pela qual, na hierarquia das leis, posta-se acima destes e abaixo daqueles. Nada obstante alguns autores entendam que tenha campo próprio de atuação – no que têm razão –, tal esfera própria de atuação não pode, à evidência, nivelar-se àquela outra pertinente à legislação ordinária. A lei complementar é superior à lei ordinária, servindo de teto naquilo que é de sua particular área mandamental." (Comentários à Constituição do Brasil. 2. ed. São Paulo: Saraiva, 2001. v. 6, t. I, p. 79/80)
12 - José Luiz Bulhões Pedreira, ao distinguir "fluxo" de "acréscimo", identifica o "acréscimo" como "acumulação" (visão estática) e a "entrada" (visão dinâmica). Representam, pois, sob o aspecto temporal, isto é, no momento de sua ocorrência, um acréscimo, vocábulo inclusive utilizado pelo legislador complementar para definir o suporte fático do imposto sobre a renda e proventos de qualquer natureza. Assim, se expressa o eminente jurista: "O sentido vulgar da renda é o produto do capital ou trabalho, e o termo é usado como sinônimo de lucros, juros, aluguéis, proventos ou receitas. A expressão ‘proventos’ é empregada como sinônimo de pensão, crédito, provento ou lucro. No seu sentido vulgar, tanto a expressão ‘renda’ quanto a ‘proventos’ implica a ideia de fluxo, alguma coisa que entra, que é recebida"(Imposto de Renda. APEC, p. 2 a 21).
13 - O Simpósio Nacional citado teve como fulcro o Caderno de Pesquisas Tributárias, vol. 11. O fato gerador do imposto sobre a renda e proventos de qualquer natureza, coed. Resenha Tributária/CEU, 1986, Coordenação de Ives Gandra Martins e escrito por Antonio Carlos Garcia de Souza, Antonio Manoel Gonçalez, Carlos da Rocha Guimarães, Gilberto de Ulhôa Canto, Gustavo Miguez de Mello, Hugo de Brito Machado, Ian de Porto Alegre Muniz, Ives Gandra da Silva Martins, José Eduardo Soares de Melo, Luciano da Silva Amaro, Ricardo Mariz de Oliveira, Wagner Balera, Waldir Silveira Mello e Ylves José de Miranda Guimarães.
14 - Escrevi: "Por essa razão, explicita o legislador complementar que a renda e os proventos implicam, necessariamente, uma aquisição. A aquisição correspondente a algo que se acrescenta, que aumenta a patrimonialidade anterior, embora outros fatores possam diminuí-las. Por isto, o aumento, como sinônimo de fluxo, lhe é pertinente. Por outro lado, o legislador complementar aclara que tipo de aquisição seria de fato imponível do tributo questionado, ou seja, aquele das disponibilidades econômicas e jurídicas. O discurso corresponde, por decorrência, a uma limitação. Não a qualquer tipo de aquisição, mas apenas àquela correspondente à ostentação de disponibilidade econômica ou jurídica refere-se o comando intermediário. Os intérpretes têm, algumas vezes, tido dificuldades em esclarecer o que seria disponibilidade jurídica, mormente ao se levar em consideração que o simples fato de uma disponibilidade econômica ter tratamento legal, tal tratamento a transforma também em disponibilidade jurídica. Temos nos insurgido contra a impropriedade redacional, a partir da concepção de que não há objeto ajurídico no Direito. E distinguir, no Direito, situações a partir da adjetivação ‘jurídica’ é tornar o gênero, espécie. No caso, todavia, passando por cima da impropriedade, a matéria tem campo próprio de explicitação, a partir do disposto nos arts. 113, 114, 116 e 117 do CTN." (O fato gerador do IR e proventos de qualquer natureza. Caderno de Pesquisas Tributárias, v. 11. Coordenação de Ives Gandra Martins. São Paulo: Resenha Tributária e Centro de Extensão Universitária, 1986. p. 266/267 – grifos meus)
15 - Henry Tilbery hospeda a mesma inteligência ao comentar o art. 44 do CTN: "b) No caso das pessoas jurídicas, aplica-se para apurar o lucro real, seguindo o conceito do acréscimo patrimonial, a teoria do balanço, que revela, além do resultado das atividades normais da empresa (lucro operacional), também outras variações patrimoniais, provenientes de operações ou ocorrências estranhas ao objeto social (transações eventuais) (Hodiernamente denominadas não operacionais). Para fins da tributação pelo imposto de renda, o resultado do balanço comercial fica sujeito a vários ajustes. De acordo com a lei ordinária, determinados itens são adicionados ao lucro real, outros são excluídos, para assim chegar ao lucro tributável. Para designar esse cômputo, que leva ao resultado, sobre o qual incide o imposto de renda da pessoa jurídica diferente do lucro apresentado pela contabilidade, usa-se a expressão balanço fiscal." (Comentários ao Código Tributário Nacional. 5. ed. Coordenação de Ives Gandra Martins. São Paulo: Saraiva, 2008. v. 1, p. 370)
16 - O Conselheiro Mário Junqueira Franco Jr., com meridiana nitidez, esclarece, em voto vencedor proferido na 8ª Câmara do 1º Conselho de Contribuintes (Acórdão nº 108-06.682): "A expressão ‘sem retirar do contribuinte o direito de compensar’ reforça o meu entendimento de que, em casos de descontinuidade da empresa, na declaração de encerramento, cabe integral compensação dos prejuízos acumulados, sendo inaplicável a trava. Todo o interesse protegido foi somente regular o fluxo de caixa do Governo, sem extirpar do contribuinte o direito à compensação de prejuízos. Qualquer hipótese na qual o efeito seja eliminar a compensação, não estará abrangida pelo campo de incidência da norma de limitação. É matéria de pura interpretação de lei. Ex positis, conheço do recurso, para no mérito dar-lhe integral provimento. É como voto; Senhor Presidente. Sala das Sessões – DF, 20 de setembro de 2001."
17 - Exposição de Motivos da MP 998/95, reeditando as MPs 947/95 e 972/95, convertida na Lei nº 9.065/95 e publicada no Diário Oficial do Congresso Nacional de 14.06.95.
18 - Zuudi Sakakihara interpreta o art. 44 do CTN afirmando: "Embora o CTN não estabeleça nenhuma restrição expressa à atuação do legislador ordinário na disciplina da matéria pertinente à base de cálculo do imposto sobre a renda, não se podem desconhecer certas limitações decorrentes de normas superiores, que devem ser obrigatoriamente observadas. A primeira delas decorre do fato de ser a renda e os proventos um acréscimo patrimonial, como define o CTN. Ora, como já se viu, somente uma riqueza nova na sua dimensão líquida é capaz de acrescer o patrimônio, o que leva a concluir que a base de cálculo deverá refletir o acréscimo patrimonial na sua expressão monetária líquida, isto é, excluídas as despesas que foram necessariamente feitas na aquisição da renda ou dos proventos. Tais despesas, portanto, devem ser obrigatoriamente deduzidas da base de cálculo, quer a lei ordinária preveja, quer não." (Código Tributário Nacional comentado. Coordenação de Vladimir Passos de Freitas. São Paulo: RT, 1999. p. 138 – grifos meus)
19 - Luciano da Silva Amaro ensina: "Em suma, o que, honestamente, pretendeu o CTN foi consagrar a teoria do acréscimo patrimonial para a conceituação do fato gerador do imposto de renda. E isso ele poderia fazer, como disposição (materialmente) complementar à Constituição, sem fugir, aliás, à tradição do Direito pátrio." (Curso de Direito Tributário. 11. ed. Coordenação de Ives Gandra da Silva Martins. São Paulo: Saraiva, 2009. p. 379 – grifos meus)
20 - Maurício Dantas Bezerra esclarece: "Assim, mediante uma interpretação sistemática e teleológica de toda a disciplina analisada, consta-se claramente que a limitação à compensação prevista no art. 15 da Lei nº 9.065/95 não alcança a última apuração de resultado por parte da sociedade a ser incorporada, isto porque: a) o intuito da norma é, nitidamente, diferir e escalonar o aproveitamento dos estoques de prejuízos fiscais, de forma a assegurar um fluxo de arrecadação mínimo e não impedi-lo; b) a norma limitadora e as decisões, proferidas pelo STJ e pelo Conselho de Contribuintes, possuem como premissa básica na sua fundamentação a continuidade das empresas; e c) por estar expressamente vedada a possibilidade da sucessora (sociedade incorporadora) compensar o saldo de prejuízos fiscais que anteriormente pertencia à sociedade incorporada, qualquer limitação ao aproveitamento deste estoque por parte desta em sua última declaração representará, indubitavelmente, tributação de seu patrimônio e não da renda." (Da inaplicabilidade da limitação à compensação de prejuízos fiscais nos casos de incorporação, fusão e cisão de sociedades. Revista Dialética de Direito Tributário, n. 96, p. 57)
21 - Leia-se, neste sentido, o Acórdão: "Acórdão nº 107-09.243 – 1º Conselho de Contribuintes / 7ª Câmara / Acórdão nº 107-09.243 em 05.12.07 – IRPJ – Ex.: 1999 – IRPJ. COMPENSAÇÃO DE PREJUÍZO. LIMITE DE 30%. EMPRESA INCORPORADA. À empresa extinta por incorporação não se aplica o limite de 30% do lucro líquido na compensação do prejuízo fiscal. (Acórdão nº CSRF/01-05.100, em Sessão de 19 de outubro de 2004, publicado no DOU de 28.02.02). Decisão: Por unanimidade de votos, dar provimento ao recurso. Marcos Vinicius Neder de Lima – Presidente. Publicado no DOU em: 27.02.08. Relator: Luiz Martins Valero. Recorrente: ——— Recorrida: 4ª T. DRJ-Campinas/SP. Data de decisão: 05.12.07. Data de publicação: 27.02.08."
22 - Leia-se a seguinte decisão do 1º Conselho de Contribuintes: "Acórdão nº 107-09.243, 1º Conselho de Contribuintes, 7ª Câmara, Acórdão nº 107-09.243 em 05.12.07 – IRPJ – Ex.: 1999 – IRPJ. COMPENSAÇÃO DE PREJUÍZO. LIMITE DE 30%. EMPRESA INCORPORADA. À empresa extinta por incorporação não se aplica o limite de 30% do lucro líquido na compensação do prejuízo fiscal. (Acórdão nº CSRF/01-05.100, em Sessão de 19 de outubro de 2004, publicado no DOU de 28.02.02). Por unanimidade de votos, dar provimento ao recurso. Marcos Vinicius Neder de Lima – Presidente; Publicado no DOU em: 27.02.08. Relator: Luiz Martins Valero. Recorrente: ——— Recorrida: 4ª T. DRJ-Campinas/SP. Data de decisão: 05.12.07. Data de publicação: 27.02.08."
23 - Depois de elencar inúmeras decisões do Conselho de Contribuintes, Pedro Anan Jr. e Juliana Grandino Latorre declaram: "É clarividente a orientação extraída do voto do M. Conselheiro, que se preocupa em garantir a aplicabilidade da limitação da compensação de prejuízos fiscais, desde que esta não resulte na retirada do direito da compensação, do contribuinte. Se assim o é, ou seja, na hipótese do limite recair sobre empresa objeto de extinção,torna-se incabível a trava de 30%. Com base nos argumentos ora indicados, entendemos que a utilização do prejuízo fiscal e da base negativa da CSLL, em decorrência da incorporação de qualquer sociedade, não estará sujeita à limitação de 30% do lucro líquido ajustado, e que as decisões por ora apresentadas configuram sólidos argumentos, bem como importantes precedentes jurisprudenciais, caso eventual fiscalização venha eventualmente questionar a limitação contida nos arts. 15 e 16 da Lei nº 9.065/96." (Ob. cit., p. 296)
24 - Os arts. 109 e 110 do CTN estão assim redigidos: "Art. 109. Os princípios gerais de direito privado utilizam-se para pesquisa da definição, do conteúdo e do alcance de seus institutos, conceitos e formas, mas não para definição dos respectivos efeitos tributários. Art. 110. A lei tributária não pode alterar a definição, o conteúdo e o alcance de institutos, conceitos e formas de direito privado, utilizados, expressa ou implicitamente, pela Constituição Federal, pelas Constituições dos Estados, ou pelas Leis Orgânicas do Distrito Federal ou dos Municípios, para definir ou limitar competências tributárias." (grifos meus)
25 - Lembro trecho do voto impecável do Conselheiro Mário Junqueira Franco Jr., já atrás mencionado: "Procuremos portanto o elemento histórico da finalidade da norma impositiva da ‘trava’. E para isso não podemos deixar de vislumbrar as lições do saudoso amigo e ex-conselheiro Edson Vianna de Brito, verdadeiro autor da norma, quando ainda ocupava, com incontestável brilhantismo, posição relevante nos quadros da Receita Federal. Edson assim discorreu sobre a norma de limitação, em seu livro Imposto de Renda, Frase Editora, São Paulo, 1995, p. 161 e ss.: ‘Este dispositivo estabelece uma base de cálculo mínima, para efeito da determinação do imposto de renda devido, através da fixação de um limite máximo de redução – por compensação de prejuízos fiscais – do lucro tributável apurado em cada ano-calendário. Em outras palavras, as pessoas jurídicas que detenham estoque de prejuízos fiscais apurados em anos anteriores passam a sujeitar-se a um imposto de renda mínimo, uma vez que o lucro tributável só poderá ser reduzido em no máximo trinta por cento. Note-se, preliminarmente, que em nenhum momento o texto legal cerceou o direito do contribuinte de compensar os prejuízos fiscais apurados até 31 de dezembro de 1994 com o lucro real obtido a partir de 1º de janeiro de 1995. Pelo contrário, ao fixar um limite máximo para compensação em cada ano-calendário, o dispositivo legal, em seu parágrafo único, faculta a compensação da parcela que seria compensável se não houvesse a limitação com o lucro real de anos calendário subsequentes." (Acórdão nº 108-06.682)
26 - O Conselheiro José Henrique Longo fundamenta, com clareza, seu voto ao dizer: "Esse raciocínio já está pacificado neste Conselho de Contribuintes. A norma (Lei nº 9.065/95, art. 15), ao impor a ‘trava’ na compensação, não pretendeu tolher o direito do contribuinte de não recolher IRPJ sobre a recuperação do capital correspondente ao lucro após prejuízo. Pretendeu sim uma arrecadação mínima, se apurado lucro líquido, com a limitação de utilização do prejuízo acumulado. Em contrapartida, extinguiu o prazo de aproveitamento do prejuízo (de 4 anos), para que o contribuinte pudesse compensar integralmente seu saldo de prejuízo fiscal, ainda que em muitos anos. Desse modo, e considerando que à empresa incorporadora é vedado o aproveitamento do saldo de prejuízo fiscal da empresa incorporada (DL 2.341/87, arts. 32 e 33), deixa de existir a premissa de inexistência de limitação de aproveitamento do prejuízo com os lucros futuros, o que compromete a legitimidade da trava do prejuízo." (Processo nº 10980.011045/99-90, Acórdão nº CSRF/01-05.100)
27 - A integração analógica é proibida por força do § 1º do art. 108 do CTN, assim redigido: "Art. 108. Na ausência de disposição expressa, a autoridade competente para aplicar a legislação tributária utilizará sucessivamente, na ordem indicada: I – a analogia; (...) § 1º O emprego da analogia não poderá resultar na exigência de tributo não previsto em lei."
28 - Yonne Dolácio de Oliveira lembra que: "Na criação e alteração dos tributos, o Legislativo dos entes de governo, por força da norma constitucional que lhes outorga a competência impositiva (e que é norma de organização da atribuição de poderes), recebe o poder para traçar na lei de incidência, o fato-tipo legal a que vai ligar, como consequência ou estatuição, o tributo. Tal atribuição assegura ao legislador ordinário, com exclusividade, a opção para a escolha dos fatos tributáveis, o poder de proceder à qualificação tipológica, isto é, a seleção de tais fatos de acordo com os fins por ele objetivados para defini-los na hipótese de incidência. Também, com exclusividade, toca-lhe o poder de determinar o quantum do tributo (base de cálculo e alíquota) e o sujeito passivo. Essa competência atribuída pela Constituição, por exigência desta, quando exercida deve observar a norma geral do art. 97 do CTN, isto é, o legislador ordinário deve proceder à definição exaustiva dos elementos do fato-tipo legal ou hipótese de incidência, do sujeito passivo, e dos elementos da quantificação do tributo – a base de cálculo e a alíquota. Visto esse poder do legislador ordinário de proceder a uma qualificação tipológica ou tipificação normática que transpõe para a hipótese de incidência da norma, cumpre anotar seus limites previstos na Constituição e leis complementares, entre elas o CTN. Naturalmente o legislador deve observar os marcos da atribuição rígida das competências aos entes de governo; e, ainda que o tributo se inclua no âmbito da sua competência, deve observar as normas gerais de organização da Constituição e das leis complementares que, em encadeamento sistemático, definem em maior grau de abstração na escala conceitual, os limites circundantes da atuação normativa do legislador ordinário." (Caderno de Pesquisas Tributárias, n. 6. Coordenação de Ives Gandra Martins. São Paulo: CEEU/Resenha Tributária, 1991. p. 503/504 – grifos meus)
29 - Antonio J. Franco de Campos interpreta: "Acreditamos não se tratar de especificações taxativas, mas exemplificativas. Dessa forma, sempre que ocorrer dúvida, mesmo fora daqueles casos, poderá empregar-se a interpretação benévola na esfera da ilicitude tributária: ‘benigna amplianda’. Admite-se que o art. 112 reflete o velho brocardo in dubio pro reo ou in dubio contra fiscum, inspirado em medida liberal", acrescentando: "Parece mesmo que o art. 112 acolhe o adágio de Modestino, formulado como reação às características do sistema jurídico romano. Em verdade, não parece injusta a posição de dúvida favorecer o contribuinte, principalmente em se tratando de ilícito tributário – teoria do favorecimento do contribuinte na interpretação da norma financeira (di oscuro significato). Outros autores firmam idêntico princípio: ‘se a incerteza deriva de texto não claro, vale a regra in dubiis questionibus reofavorendum est (...) se, ao contrário falta prova certa, a norma financeira é interpretada contra fiscum, pois melior est conditio possidentis. 92. Finalmente, nos casos de dúvida, adota-se a solução mais favorável ao contribuinte, segundo uma preponderante corrente de opinião." (Comentários ao Código Tributário Nacional. 5. ed. Coordenação de Ives Gandra Martins. São Paulo: Saraiva, 2008. v. 2. p. 144/145)
30 - Escrevi: "Com efeito, em direito tributário, só é possível estudar o princípio da legalidade através da compreensão de que a reserva da lei formal é insuficiente para a sua caracterização. O princípio da reserva da lei formal permitiria uma certa discricionariedade, impossível de admitir-se, seja no direito penal, seja no direito tributário. Como bem acentua Sainz de Bujanda (Hacienda y derecho. Madrid, 1963. v. 3, p. 166), a reserva da lei no direito tributário não pode ser apenas formal, mas deve ser absoluta, devendo a lei conter não só o fundamento, as bases do comportamento a administração, mas – e principalmente – o próprio critério da decisão no caso concreto. À exigência da lex scripta, peculiar à reserva formal da lei, acresce-se da lex stricta, própria da reserva absoluta. É Alberto Xavier quem esclarece a proibição da discricionariedade e da analogia, ao dizer (ob. cit., p. 39): ‘E daí que as normas que instituem sejam verdadeiras normas de decisão material (Sachentscheidungsnormen), na terminologia de Werner Flume, porque, ao contrário do que sucede nas normas de ação (handlungsnormen), não se limitam a autorizar o órgão de aplicação do direito a exercer, mais ou menos livremente, um poder, antes lhe impõem o critério da decisão concreta, predeterminando o conteúdo de seu comportamento’. Yonne Dolácio de Oliveira, em obra por nós coordenada (Legislação tributária, tipo legal tributário. In: Comentários ao CTN. Bushatsky, 197. v. 2, p. 138), alude ao princípio da estrita legalidade para albergar a reserva absoluta da lei, no que encontra respaldo nas obras de Hamilton Dias de Souza (Direito Tributário. Bushatsky, 1973. v. 2) e Gerd W. Rothmann (O princípio da legalidade tributária. In: Direito Tributário. 5ª coletânea, coordenada por Ruy Barbosa Nogueira. Bushatsky, 1973. p. 154). O certo é que o princípio da legalidade, através da reserva absoluta de lei, em direito tributário permite a segurança jurídica necessária, sempre que seu corolário consequente seja o princípio da tipicidade, que determina a fixação da medida da obrigação tributária e os fatores dessa medida, a saber: a quantificação exata da alíquota, da base de cálculo ou da penalidade. É evidente, para concluir, que a decorrência lógica da aplicação do princípio da tipicidade é que, pelo princípio da seleção, a norma tributária elege o tipo de tributo ou da penalidade; pelo princípio do numerus clausus veda a utilização da analogia; pelo princípio do exclusivismo torna aquela situação fática distinta de qualquer outra, por mais próxima que seja: e finalmente, pelo princípio da determinação, conceitua de forma precisa e objetiva o fato imponível, com proibição absoluta às normas elásticas (Resenha Tributária 154:779-82, Secção 2.1, 1980)." (Curso de Direito Tributário. São Paulo: CEEU/FIEO, Saraiva, 1982. p. 57/58)
31 - Hiromi Higuchi, talvez o melhor intérprete da legislação do imposto sobre a renda para pessoas jurídicas, hospeda idêntica inteligência ao dizer: "O entendimento é justo porque o prejuízo fiscal e base negativa de CSLL da sociedade incorporada que não forem compensados na última declaração de incorporação não poderão ser aproveitados pela sucessora." (Imposto de Renda das empresas: interpretação e prática. 34. ed. São Paulo: IR Publicações, 2009. p. 63 – grifos meus)
32 - Elenca o eminente advogado consulente, Dr. José Mauro Marques, expressivas decisões do Conselho de Contribuintes, algumas já reproduzidas ou constantes neste parecer, mas que vale a pena repetir nas respostas às indagações formuladas. Leia-se de seu recurso: "Transcreva-se ementas dos Acórdãos ns. 108-06682, 108-06683 e 108-126.597, da 8º Câmara do Primeiro Conselho de Contribuintes (docs. 3, 4 e 5); 101-94.515 e 101-122.596, da 1ª Câmara do Primeiro Conselho de Contribuintes (docs. 6 e 7); e 107-09.243, da 7ª Câmara do Primeiro Conselho de Contribuintes (doc. 8): ‘INCORPORAÇÃO. DECLARAÇÃO FINAL DA INCORPORADA. LIMITAÇÃO DE 30% NA COMPENSAÇÃO DE PREJUÍZOS. INAPLICABILIDADE. No caso de compensação de prejuízos fiscais na última declaração de rendimentos da incorporada, não se aplica a norma de limitação a 30% do lucro líquido ajustado. Recurso provido.’ (Acórdão nº 108-6682, Sessão de 20.09.01) ‘INCORPORAÇÃO. DECLARAÇÃO FINAL DE INCORPORADA. LIMITAÇÃO DE 30% NA COMPENSAÇÃO DE PREJUÍZOS. INAPLICABILIDADE. No caso de compensação de prejuízos fiscais na última declaração de rendimentos da incorporada, não se aplica a norma de limitação de 30% do lucro líquido ajustado.’ (Acórdão nº 108-06683, Sessão de 20.09.01) ‘COMPENSAÇÃO. PREJUÍZO E BASE NEGATIVA. No caso de incorporação, uma vez que vedada a transferência de saldos negativos, não há impedimento legal para estabelecer limitação, diante do encerramento da empresa incorporada.’ (Acórdão nº 108-126.597, Sessão de 02.12.02) ‘COMPENSAÇÃO DE PREJUÍZOS. LIMITE LEGAL. BALANÇO DE CISÃO. LIMITAÇÃO DE 30% NA COMPENSAÇÃO DE PREJUÍZOS. O art. 33 do Decreto-Lei nº 2.341/87 determina que a pessoa jurídica sucessora por incorporação, fusão ou cisão não poderá compensar prejuízos fiscais da sucedida, dispondo o parágrafo único que, no caso de cisão parcial, a pessoa jurídica cindida poderá compensar os seus próprios prejuízos, proporcionalmente à parcela remanescente do patrimônio líquido. Em relação à parcela proporcional ao patrimônio líquido transferido, a limitação retiraria a possibilidade de compensação. Por essa razão, no balanço de cisão, a parcela de prejuízos proporcional ao patrimônio transferido pode ser compensada independentemente da limitação de 30%.’ (Acórdão nº 101-94.515, Sessão de 17.03.04) ‘IRPJ. COMPENSAÇÃO DE PREJUÍZO. LIMITE DE 30%. EMPRESA INCORPORADA. À empresa extinta por incorporação não se aplica o limite de 30% do lucro líquido na compensação do prejuízo fiscal.’ (Acórdão nº 101-122.596, Sessão de 19.10.04) ‘IRPJ. COMPENSAÇÃO DE PREJUÍZO. LIMITE DE 30%. EMPRESA INCORPORADA. À empresa extinta por incorporação não se aplica o limite de 30% do lucro líquido na compensação do prejuízo fiscal. (Acórdão nº CSRF/01-05.100, em Sessão de 19 de outubro de 2004, publicado no DOU de 28.02.02) Por unanimidade de votos, dar provimento ao recurso.’ (Acórdão nº 107-09.243, Sessão de 05.12.07) 4.3. Colacionam-se, ainda, outros julgados da 1ª e da 8ª Câmaras do Conselho de Contribuintes (docs. 9 e 10): A) Órgão: 1º Conselho de Contribuintes/1ª Câmara. 1º Conselho de Contribuintes/1ª Câmara/Acórdão nº 101-95.872 em 09.11.06, publicado no DOU em: 21.08.07. Relator: João Carlos de Lima Júnior – IRPJ e outro – Exs: 2000. ‘IRPJ. COMPENSAÇÃO DE PREJUÍZO FISCAL. LIMITE DE 30%. EMPRESA INCORPORADA. A lei não traz qualquer exceção à regra que limita a compensação dos prejuízos fiscais a 30% do lucro líquido ajustado. Entretanto, havendo o encerramento das atividades da pessoa jurídica em razão de incorporação, não haverá meios dos prejuízos serem utilizados em anos subsequentes, como determina a legislação. Neste caso, tem-se como legítima a compensação da totalidade do prejuízo fiscal, sem a limitação de 30%.’ B) Órgão: 1º Conselho de Contribuintes / 8ª Câmara – 1º Conselho de Contribuintes / 8ª Câmara / Acórdão nº 108-07.456 em 02.07.03- Publicado no DOU em: 24.09.03. Relator: José Henrique Longo – IRPJ e outros – Exs: 1996. ‘IRPJ. COMPENSAÇÃO DE PREJUÍZO. LIMITE DE 30%. EMPRESA INCORPORADA. À empresa extinta por incorporação não se aplica o limite de 30% do lucro líquido na compensação do prejuízo fiscal.’"
33 - Carlos Maximiliano ensina: "Consiste o Processo Sistemático em comparar o dispositivo sujeito a exegese, com outros do mesmo repositório ou de leis diversas, mas referentes ao mesmo objeto. Por umas normas se conhece o espírito das outras. Procura-se conciliar as palavras antecedentes com as consequentes, e do exame das regras em conjunto deduzir o sentido de cada uma", continuando: "Não se encontra um princípio isolado em ciência alguma, acha-se cada um em conexão íntima com outros. O Direito objetivo não é um conglomerado caótico de preceitos; constitui vasta unidade, organismo regular, sistema, conjunto harmônico de normas coordenadas, em interdependência metódica, embora fixada cada uma no seu lugar próprio. De princípios jurídicos mais ou menos gerais deduzem corolários; uns e outros se condicionam e restringem reciprocamente, embora se desenvolvam de modo que constituem elementos autônomos operando em campos diversos. Cada preceito, portanto, é membro de um grande todo; por isso do exame em conjunto resulta bastante luz para o caso em apreço." (Hermenêutica e aplicação do Direito. 16. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1979. p. 128)
34 - Os três dispositivos estão assim redigidos: "Art. 145. (...) § 1º Sempre que possível, os impostos terão caráter pessoal e serão graduados segundo a capacidade econômica do contribuinte, facultado à administração tributária, especialmente para conferir efetividade a esses objetivos, identificar, respeitados os direitos individuais e nos termos da lei, o patrimônio, os rendimentos e as atividades econômicas do contribuinte." "Art. 150. Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios: (...) II – instituir tratamento desigual entre contribuintes que se encontrem em situação equivalente, proibida qualquer distinção em razão de ocupação profissional ou função por eles exercida, independentemente da denominação jurídica dos rendimentos, títulos ou direitos; (...) IV – utilizar tributo com efeito de confisco." (grifos meus)

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