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Simon saúda pacto contra impunidade defendido pelo presidente da OAB


19/02/2010 15h17

Brasília, 19/02/2010 - A existência de um pacto no Judiciário contra a impunidade, defendido pelo presidente nacional da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), Ophir Cavalcante, foi saudada nesta quinta-feira, da tribuna do Senado, por Pedro Simon (PMDB-RS), que previu "uma nova forma de fazer política" após a prisão do governador licenciado do Distrito Federal, José Roberto Arruda. O senador considerou positiva a percepção da sociedade de que "ninguém ficará impune se praticar ato lesivo à população".

Simon enalteceu o teor de recentes declarações feitas pelo presidente nacional da OAB, ao defender a necessidade dejulgamento mais célere de processos que envolvam atos de corrupção em qualquer esfera de poder. Simon disse concordar plenamente com o posicionamento de Ophir Cavalcante quanto à necessidade de se priorizar processos contra quem tem o dever de cuidar dos recursos públicos. "A minha tese é a de que ninguém possa tomar posse em cargo público com pendências no Judiciário.Não estou antecipando, a priori, possíveis condenações: eu, apenas, defendo a ideia da necessidade de priorizar julgamentos de quem se propõe manusear recursos que são de todos. Principalmente de quem sofre a dor das filas dos hospitais". 

Simon destacou, ainda, a defesa feita por Ophir Cavalcante, para que toda a magistratura brasileira entre na cruzada contra a corrupção, dando celeridade a processos envolvendo casos de corrupção e de cobrança do dinheiro público desviado. "Eu fico imaginando se conseguíssemos recuperar, pelo menos, uma parte significativa destes recursos que são de todos nós. Não teríamos mais fome. Nem miséria".

Ao final de seu discurso, o senador ainda elogiou o fato de a OAB seguir se posicionando pela ética na política. "A mesma OAB que esteve, muitas vezes, à frente das multidões, nas ruas, pela moralidade no tratamento dos recursos que são de todos. Que as palavras do presidente da OAB também façam eco em todos os corredores, em todos os gabinetes. E que mudem corações e mentes".

A seguir a íntegra do discurso proferido pelo senador Pedro Simon:

"Senhor Presidente,

Senhoras Senadoras e Senhores Senadores:

O Brasil está vivendo, quem sabe, um dos mais importantes momentos da sua história política. Muita gente ainda não deu aos fatos registrados pela imprensa, nos últimos dias, e que culminaram na prisão de um governador, o devido valor. Mas, com certeza, todos nós vamos sentir uma mudança radical no modo de fazer política, daqui para o futuro. Não digo, tão somente, para os governantes de agora, mas para todos aqueles que terão seus nomes submetidos ao crivo dos eleitores, na próxima eleição.

Nós já vivemos momento semelhante, no início da última década. O país saía de um tempo de escuridão e de medo. O povo ocupou as ruas, pediu eleições direitas, elegeu o seu presidente da República e, menos de dois anos depois, exigiu a sua cassação.  Parecia que, a partir dali, haveria uma profunda depuração em todos os desvios de dinheiro público.

Que, pelo menos no Poder Executivo, seria inaugurada outra conduta, agora orientada pelos mais puros princípios éticos. O impeachment foi, sem dúvida, um grito da população, cansada de desvios do dinheiro que, ela mesma, sente falta na fila dos hospitais e na escuridão do analfabetismo.

Aquela CPI do início da década passada nada mais foi que o eco deste mesmo grito das ruas. Os caras-pintadas derrubaram as paredes dos conchavos e exigiram ética na política.  

Logo depois, a CPI do Orçamento. O Congresso "cortou na própria carne", como se dizia, à época. Foram cassados dez parlamentares, todos eles pilhados em desvios de recursos do Orçamento da União. Os mesmos recursos, portanto, que seriam utilizados nos hospitais, nas escolas, na segurança pública e no incentivo a atividades produtivas geradoras de emprego e de renda.

Mais uma vez, a população demonstrou a esperança de que algo de novo, e muito diferente e melhor, estaria acontecendo, a partir de então, no trato do dinheiro publico.

A realidade cuidou de demonstrar, depois, que o tempo nem sempre é senhor da razão. Os desvios se multiplicaram, tanto no Executivo como no Legislativo. A corrupção tomou novas formas, municiadas por antídotos às investigações que cassaram um presidente e diversos parlamentares.

As CPIs tornaram-se verdadeiros cartórios de expedição de atestados de idoneidade indevidos, ou em palcos para disputas políticas locais. Muitas vezes, chegou-se à conclusão de que teria sido melhor não haver a CPI, do que a investigação mal conduzida, ou direcionada para nada encontrar, embora os sinais evidentes de desvios de conduta.

O Executivo ergueu outros muros. Outros conchavos, agora com outros nomes, como "recursos não contabilizados de campanha", mas que, na verdade, mais serviram para a montagem de "maiorias", sob a pecha da tal de "governabilidade".

A lei passou a depender, muito mais, da liberação de emendas e do preenchimento de cargos, e não da consciência do legislador, que deveria, sempre, ser moldada pelos interesses coletivos, e não individuais ou de grupos.  

Por que, então, essa minha esperança de que, hoje, a população pode acreditar em um tempo de mudança em posturas políticas acostumadas à falta de ética no trato de recursos públicos tão necessários e, aparentemente, escassos?

É que, desta vez, as iniciativas estão partindo, diretamente, da instituição mais importante para coibir a verdadeira causa da corrupção no Brasil.

A instituição, o Poder Judiciário, e a causa, a impunidade. 

Antes, mesmo que como arremedos, as punições se centravam, muito mais, nas consequências da corrupção, e não nas causas. Assim, as formas de desvios de recursos apenas se alteravam, e dependiam, unicamente, da criatividade de seus autores.

A mídia nunca exerceu o seu papel fundamental de "olhos da população" no Poder Judiciário, pelo menos tanto quanto o faz, e com veemência, no Poder Executivo e, principalmente, no Congresso. 

O Judiciário sempre foi uma instituição que se escondia sob becas. E que se movia, muito mais rapidamente, quando o advogado era o mais bem pago. Advogados não raramente também remunerados através de recursos escusos.

A imprensa nunca cuidou, como devido, do Poder Judiciário. Submeteu-se ao crivo dos pedidos de audiência. Muito diferente do Legislativo, onde parlamentar e repórter convivem em corredores e gabinetes. Talvez também porque, pela própria característica do mandato, o parlamentar tenha que ser mais ávido por holofotes.

Acho que são estes mesmos holofotes que lançaram luz além das paredes do Judiciário. No princípio, parecia que este ou aquele Ministro, ou juiz, também mais ávido por protagonismos, sensíveis à presença de microfones, pareciam vulgarizar a liturgia de seus respectivos cargos. Parece que o efeito foi, ao contrário do que se poderia imaginar, benéfico. Abriu um flanco para a entrada do "olho do cidadão", a imprensa.

Eu acho que essa pode ser a grande mudança de rumos na política brasileira, neste momento da nossa história: o grito das ruas também fazer eco além das paredes do Judiciário.

Nos gabinetes de quem tem, como função constitucional, que fazer cumprir as leis. A instituição, enfim, que pode, efetivamente, acabar com a impunidade, a causa maior da corrupção.

É por isso que eu acredito na mudança de rumos na política brasileira, a partir de agora: diferente de antes, estamos tratando da causa da corrupção, e não unicamente dos seus efeitos.

Todas as CPIs do Congresso Nacional, quando o assunto é corrupção, pecaram por não contemplar as duas faces de uma mesma moeda: de um lado, o corrupto; do outro, o corruptor. Aliás, acho até que se trata de uma moeda de uma só face. Mas, sempre se cuidou, ainda que sem a abrangência necessária, do corrupto. Investigar o corruptor sempre foi assunto proibitivo.

Eu mesmo apresentei número suficiente de assinaturas para a instalação da chamada "CPI dos Corruptores".

Exerci, portanto, o meu direito, enquanto minoria. Mas, a maioria não permitiu que ela fosse instalada. A mesma maioria que se encastela nas liberações de emendas do orçamento e no preenchimento de cargos públicos. A mesma maioria que se esconde no discurso, talvez prática, da tal "governabilidade". Uma governabilidade que, segundo o Presidente da República, faria com que "Cristo tivesse que fazer acordos com Judas".

De repente, um Judiciário que parecia querer trocar "Vossa Excelência" por "Vossa Santidade", expõe ao público, através da imprensa, que quer estar mais próximo das ruas, para que possa, também, fazer eco. O "Olimpo", que parecia só lançar raios fulminantes para muitos e libertários para poucos, parece que desceu os primeiros degraus que pode, enfim, levá-lo ao encontro da sociedade.

O Presidente da Ordem dos Advogados do Brasil, Ophir Cavalcante, percebeu, muito bem, esta mudança. Para ele, "há um pacto contra a impunidade dentro do Poder Judiciário".

Em princípio, esta afirmação, que repito ser correta, do Presidente da OAB, não deveria passar de uma mera redundância. Ora, seria necessário um pacto para que o Poder, que tem como princípio constitucional fazer cumprir as leis, coloque-se contra a impunidade?

Esta já não deveria ser a norma de conduta natural de quem faz cumprir as leis? Ou impunidade não é sinônimo de descumprimento legal? Vou ao "Aurélio": impune é "aquele que escapa, ou escapou à punição".

De toda forma, bem-vindo o pacto do Judiciário, contra a impunidade. Bem-vindo no "fazer cumprir" as leis. E que elas não sejam cumpridas, apenas, para aqueles que não têm condições de "escapar à punição", porque não têm condições de contratar o advogado de grife.

Mas, o Presidente da OAB vai além, quando trata da prisão, pela primeira vez, de um governador: "Espero que seja um marco na luta contra a corrupção no Brasil. Precisávamos de uma atitude firme e corajosa do Superior Tribunal de Justiça, como precisamos de outros tribunais, porque o Judiciário, neste momento, é o grande aliado da sociedade brasileira na luta contra a corrupção".

Mais que aliado, eu diria. Na verdade, o responsável. Responsabilidade não só pelo que tem que fazer, constitucionalmente. Mas, pelo que vai acontecer, nesta mesma sociedade, quando se souber que ninguém ficará impune, se praticar atos lesivos à população.

Que os processos "não tenham capa, mas conteúdo", como disse o Ministro Marco Aurélio, ontem, chamando o preso de "paciente".

Continua o Presidente da OAB: "Precisamos priorizar cada vez mais o julgamento de processos que envolvam atos de corrupção em qualquer esfera de poder. A minha expectativa é que o Judiciário inaugure um novo tempo nessa relação com a sociedade, ampliando a confiabilidade e assumindo o compromisso de se unir no sentido de combater a corrupção".

Concordo, plenamente, com a ideia do Dr. Ophir Cavalcante. Aliás, essa é uma tese que eu venho defendendo desde muito tempo: processos contra quem tem o dever de cuidar dos recursos públicos têm que ser priorizados. A dor da fila do hospital não espera. A minha tese é a de que ninguém possa tomar posse em cargo público com pendências no Judiciário. Não estou antecipando, a priori, possíveis condenações: eu, apenas, defendo a ideia da necessidade de priorizar julgamentos de quem se propõe manusear recursos que são de todos. Principalmente de quem sofre a dor das filas dos hospitais.

Segue o Presidente da OAB: "Quero crer que a própria sociedade e o Conselho Nacional de Justiça apontam nesse sentido. Precisamos avançar muito, há muito que corrigir, mas a gente vê uma luz no fim do túnel. Gostaríamos que toda magistratura brasileira entrasse nessa cruzada contra a corrupção, dando celeridade a processos que são importantes, para mostrarmos a verdadeira face da sociedade brasileira, uma sociedade do bem". 

Digo eu, na mesma trilha do Dr. Ophir, que a instalação do Conselho Nacional de Justiça foi um passo importante nesta mudança de postura do Judiciário.  Criou uma instância de controle interno. De acelerador e freios. Mas, ainda é insuficiente. Trata-se de uma criação de dentro para fora. É preciso que a sociedade participe mais ativamente nos rumos do Judiciário. Quem sabe com a criação de Conselhos locais, ou regionais, compostos de entidades representativas da população. Eu já levantei, em outra oportunidade, esta mesma tese. Voltarei a ela, em breve, porque o momento me parece o mais propício para discutir essa questão.

Até que a minha ideia frutifique, e assim espero, a imprensa deverá continuar exercendo este papel, fundamental, de dar transparência aos atos de quem tem o dever de fazer cumprir as leis e, principalmente, no sentido de que a justiça tem que ser igual para todos, sem qualquer tipo de discriminação.

Mas, o Presidente da OAB levanta uma tese que eu julgo da maior relevância: a de que "o Estado tem que ser competente na cobrança do dinheiro público desviado". 

Os números sobre os desvios de dinheiro público, no Brasil e no mundo, são muito diferentes, dependendo dos métodos de cálculo. Métodos quase sempre subjetivos, obviamente, porque a corrupção nem sempre deixa rastros estatísticos.

Sabe-se, entretanto, que, no planeta, visitam a casa dos trilhões. No Brasil, dos bilhões.

Dinheiro suficiente para que não tenhamos, nunca mais, a tal dor da fila dos hospitais. Nem da escuridão do analfabetismo. Nem da insegurança que nos lança, diariamente, numa espécie de guerra civil não declarada.

Eu fico imaginando se conseguíssemos recuperar, pelo menos, uma parte significativa, destes recursos que são de todos nós. Não teríamos mais fome. Nem miséria.  É bom lembrar que, no planeta, a cada quatro segundos, um ser humano é varrido da vida, pelas ondas mortíferas da fome. De todas essas vítimas, seis milhões são crianças, todos os anos!

No Brasil, há quem defenda a tese de que o Programa Fome Zero é um desperdício. Na maioria das vezes, pessoas que nem ao menos se dão conta de que a fome brasileira seria, efetivamente, zero, se conseguíssemos de volta uma parte, percentualmente pequena, talvez, dos recursos que nos são roubados, através da corrupção.

Acontece que o faminto e o corrupto não freqüentam os mesmos lugares. Ou, quando o fazem, o faminto é expulso porque "infesta" o ambiente do corrupto. Constrangimentos de outra ordem, nunca como sinônimo de peso de consciência.

Que bom a OAB continuar se posicionando pela ética na política. A mesma OAB que esteve, muitas vezes, à frente das multidões, nas ruas, pela moralidade no tratamento dos recursos que são de todos.

No final da entrevista, o Dr. Ophir Cavalcante é categórico: "Há de haver, sim, uma sanção penal para que essas pessoas sintam que a lei é igual para todos. Há de haver a penalidade em relação aos direitos políticos, que hoje é limitada. Há de haver uma punição para afastar essas pessoas que tanto mal fazem à política, à sociedade brasileira".

Que as palavras do Presidente da OAB também façam eco em todos os corredores, em todos os gabinetes. E que mudem corações e mentes. Muitos passos já foram dados, na luta contra a corrupção e sua maior causa: a impunidade. Mas, é bom que se diga, também, que muitos desses mesmos passos não foram adiante. O combate à impunidade tem que ser, sempre, um caminho sem volta.

A corrupção e a impunidade nos lançaram numa espécie de túnel escuro e cinzento. A nossa esperança, agora reforçada, é a de que, mesmo que lá no final, haverá uma luz.

Era o que eu tinha a dizer."


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