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Asfor Rocha: 'STJ vai eliminar o uso do papel'


08/06/2009 12h07

Do jornal do Commercio

08/06/2009 - Reduzir de cinco meses para dez dias o prazo de distribuição dos processos. Esta é uma das metas do presidente do Superior Tribunal de Justiça (STJ), Cesar Asfor Rocha, com o processo eletrônico. A corte inaugura hoje uma nova fase do Judiciário brasileiro e se torna a primeira a processar os conflitos judiciais de forma virtual. De uma só vez, o Tribunal distribuirá pelo sistema e-STJ, aos seus 33 ministros, 65 mil recursos e agravos de instrumentos protocolados desde 2 de janeiro deste ano. Ao Jornal do Commercio, Asfor Rocha não citou números, mas contou que o investimento realizado foi menor que o esperado. O programa foi desenvolvido por técnicos do próprio tribunal e será oferecido gratuitamente às cortes do País que tiverem interesse.

Os benefícios são vários, explicou o ministro. Os autos poderão ser acesssados a qualquer momento e ao mesmo tempo por advogados, partes e ministros. E o prazo para ingressar com a petição, que nos cartórios termina as 19h, poderá ser até às 23h59, através da internet. Esse é o projeto mais ousado do Judiciário. O STJ será o primeiro tribunal do mundo a eliminar o papel completamente, afirmou o presidente do STJ, destacando os próximos desafios. O primeiro é digitalizar o acervo de 272 mil processos e convencer os demais tribunais a remeter os autos por meio eletrônico. É preciso empolgação para isso dar certo, porque são muitas as barreiras a serem quebradas.

O que o projeto de virtualização prevê?
Nosso projeto de virtualização tem algumas fases. A primeira delas, que já está em pleno andamento, é a que permitiu a virtualização dos agravos de instrumentos e recursos especiais que chegaram ao Tribunal a partir do dia 2 de janeiro deste ano. A média é de 800 processos por dia. Esse projeto envolve a certificação, para saber se todas as folhas que estavam no processo em papel foram digitalizadas. Depois, há a indexação das peças processuais, a autuação e a classificação. A partir de hoje, esses processos já virtualizados serão distribuídos por meio eletrônico. Então, não haverá mais a circulação em papel. São 65 mil processos, que ingressaram somente neste ano. A segunda fase é virtualizar todo o acervo do STJ. São 272 mil processos. A terceira fase, que poderá ser desenvolvida concomitantemente com a anterior, visa a estimular todos os tribunais a nos remeter os processos já digitalizados, evitando assim essa ida e vinda. Gastamos R$ 20 milhões com os Correios, todo ano, para remeter e devolver os processos. Então, além da economia, teremos velocidade. Um recurso especial, de qualquer estado, leva de seis a oito meses entre vir para o STJ e ser distribuído. Com o processo digital, vamos suprimir 90% desse tempo. Haverá mais segurança, uma vez que, no transporte, os papéis podem se perder e prejudicar o recorrente de morte. Há também a comodidade. Os advogados poderão, de onde estiverem, acessar e ler o processo como se estivessem aqui. Isso de forma compartilhada, pois os juízes também poderão ver o processo ao mesmo tempo. Hoje, quando se fala que um tribunal está informatizado, está a se dizer que há apenas o andamento de uma ou outra decisão.

A possibilidade de acesso a qualquer hora alterou o prazo para as partes verem os autos?
O prazo continua. Ou seja, ainda serão feitas as intimações para as partes, apenas elas não vão mais precisar tirar o processo do Tribunal. No entanto, vamos admitir que o advogado queira o processo porque gosta de tê-lo em papel. Ele poderá imprimir, e se ele disser eu só acredito se for ao STJ. No Tribunal, há várias possibilidades. Uma é a de receber um CD ou um pendrive com o processo gravado. E se, mesmo assim, ele quiser o processo impresso, simples: ele não paga por uma cópia? Então, nós imprimiremos e ele pagará pela folha. O objetivo é eliminar o papel, dar mais velocidade, diminuir os custos e proporcionar mais qualidade de trabalho e melhor qualificação profissional para todos.

Como será a digitalização do estoque?
Vamos passar um tempo convivendo com esses processos. Por causa do contigenciamento que houve por parte do governo, atrasamos a digitalização. Nossa ideia é que até o final do ano ocorra a absoluta eliminação do papel. Estamos viabilizando recursos para que os 272 mil processos também sejam virtualizados, pois esse trabalho será terceirizado. É absolutamente impossível fazermos isso. Por baixo, teremos 200 milhões de folhas a serem digitalizadas.

Que medidas foram tomadas para a melhor adaptação dos ministros ao novo sistema?
Tem muitos magistrados que trabalham com duas telas, por exemplo. No entanto, o magistrado que não tem compatibilidade com isso, poderá fazer a impressão. Só que não haverá necessidade de imprimir o processo inteiro, e sim duas ou três peças. No entanto, acho que isso acontecerá muito pouco, devido à facilidade. Ao invés de transcrever um acórdão, basta puxar ali e colar. É uma agilidade muito maior.

Qual foi o investimento realizado pelo STJ para efetivar esse projeto?
Muito menos do que se pensava. Todo o programa de informática foi desenvolvido pelo corpo funcional e técnico do STJ. E é compartilhado não somente para o pessoal de informática, como para quem trabalha com processo, faz a discrição, assim como para o pessoal das secretarias. Vamos, inclusive, disponibilizar (esse sistema) para os tribunais que quiserem. Vou lhe dizer algo: é preciso empolgação para isso dar certo, porque são muitas as barreiras a serem quebradas.

Que barreiras seriam essas?
Primeiro, a resistência. Quebrar paradigmas é algo muito difícil. Tem que haver a decisão política de querer fazer. Depois, vem mudar rotinas. No início, os servidores tinham medo de tornarem-se desnecessários. Eles estão vendo que isso não ocorrerá e que terão qualificação profissional e qualidade na ambiência do trabalho muito maior. Os ministros também acharam que isso poderia trazer incômodos, mas hoje há uma empolgação geral. Há ainda resistência por parte dos advogados. O próprio presidente da Ordem dos Advogados do Brasil disse que haveria dificuldade porque nem todos têm acesso (à internet). Mas lhe digo que há vantagens. O acesso é 24 horas por dia. No processo normal, o prazo para dar entrada na petição termina às 19h. No processo virtual, vai até às 23 horas, 59 minutos e 59 segundos. Custos para isso existem, mas imagine o quanto não teremos de economia? Isso não é gasto, é investimento. Trata-se de economia financeira, de papel, de energia e até de mais vagas no estacionamento, já que as pessoas deixarão de vir aqui. Os ministros também terão mais tempo. Os benefícios são vários, sem falar no meio ambiente. Esse é o projeto mais ousado do Judiciário. O STJ será o primeiro tribunal do mundo a eliminar o papel completamente.

Como tem sido o diálogo com os tribunais sobre a implantação do processo virtual?
Estamos conversando muito com os tribunais. Fiz reuniões com todos os presidentes. Isso (o processo virtual) vai ser benéfico para todo mundo. Hoje, o processo chega e volta. Ou seja, digitalizamos tudo e devolvemos o processo para eles. O que os tribunais, então, vão fazer com esse processo?

O processo virtual poderá diminuir o tempo para a distribuição?
Hoje, o tempo é de cinco meses. Quando (o projeto) estiver em absoluto funcionamento, a previsão é de que ocorra em dez dias. Recebemos, por dia útil, 1.200 processos.

Haverá mudanças nos cartórios?
T
odos serão virtualizados e certos procedimentos internos serão suprimidos. Por exemplo, quando o processo chega ao STJ, até chegar ao gabinete do ministro, há muitas remessas de uma seção para a outra. Isso será suprimido.

Há algum tempo houve a aprovação da Lei de Recursos Repetitivos e agora o STJ introduz o processo digital. Na sua avaliação, que outro instrumento se faz preciso para dar mais agilidade à corte?
Se tivéssemos, no STJ, a súmula vinculante e a Lei de Recursos Repetitivos imprimisse maior obrigatoriedade dos tribunais se conformarem, teríamos mais agilidade. Por exemplo, o Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul, em muitos casos, tem contrariado a orientação dada pelo STJ. Há, então, tribunais muito resistentes. Ao invés de acolherem logo nossa tese, julgam contra e o processo vem para cá, provocando perda de tempo, mais custas e mais demora.

Como seria essa súmula vinculante para o STJ?
Nos moldes da que há para o Supremo Tribunal Federal. No âmbito da matéria infraconstitucional, porque não criar a súmula vinculante? A súmula vinculante gerou resistência nos juízes porque um dos princípios mais sagrados aos magistrados é a independência para julgar de acordo com o que ele quiser. Estamos vivendo em outra época: a das demandas de massa. Antes, era o caso a caso. Hoje, milhares de casos constituem-se em um caso. São as demandas de consumidores, que envolvem a telefonia, o sistema financeiro e os contratos bancários. Um mesmo tema que importa na deflagração de milhares de processos. Para as demandas de massa é preciso haver soluções de massa, do contrário não daremos conta. A cada ano ingressam no Brasil cerca de 20 milhões de novas ações. Temos cerca de 65 milhões de ações em andamento. Se for cada caso é um caso, não teremos como dar vazão. A súmula vinculante, a Lei de Recursos Repetitivos e a súmula impeditiva de recurso visam a isso: as demandas de massa. Hoje, os juízes perceberam isso. Hoje, então, já há essa consciência de que realmente temos que otimizar o Judiciário. Quanto à sumula vinculante, é o STJ que dá a última palavra em matéria infraconstitucional. Então, não haveria empecilho. Temos que mudar essa lógica. O juiz tem total independência. Mas será que ele precisa mesmo de independência para julgar 130 mil processos sobre uma mesma questão?


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